terça-feira

hoje, 21.30h jardim A. Borges cinema




epois de assistir Stromboli fez muito mais sentido a aproximação que fazem entre Rossellini e Rohmer. Há momentos neste filme que o estilo é muito parecido ao do diretor francês. O registro de personagens (historicamente) pequenos; pouca preocupação, ou até mesmo uma provocação fleumática com a progressão dramática; a atenção nas relações do cotidiano e na tensão entre personagens que vêem o mundo de maneira diferente.

Mas o que parece diferir Rohmer de Rossellini é que este, através personagens e suas histórias, faz um comentário alegórico sobre a Itália recém saída da segunda guerra mundial. Este comentário é o do processo que um país antigo (o sul da Itália, principalmente) começa a passar com a entrada de elementos modernos em sua sociedade. Esta é claramente a situação de conflito do casal do filme, Antonio (Maro Vitale) e Karin (Ingrid Bergman), e de Karin com o povoado de Stromboli.

A ilha de Stromboli representa o antigo, o estagnado, o primitivo. Um aglomerado de pessoas que vive em forte ligação com a natureza, tendo a brutalidade impessoal dela no seu modo de existir, como quando Antonio mata um coelho com um furão, ou a cena da pesca de atum. Nesta última em especial, vemos outra parte do estilo do filme de Rossellini, o registro bastante documental das ações do povoado.

O povo age como parte constituinte da geografia local se adaptando as atividades do Vulcão, símbolo maior do primitivismo local. Exemplo disso é a cena em que o vulcão entra em erupção e o povoado todo se ilha em barcos no meio do mar. Essa relação do vulcão, o gigante que cria e destrói, parece ser a imagem perfeita deste modo de ser primitivo, que vive em ciclos, que respeita o que é bruto e antigo, que não muda (há isso também em A Terra Treme, de Visconti). Do outro lado temos a desolada Karin, refugiada de guerra, de origem do leste europeu, mas de hábitos cosmopolitas. E são seus hábitos também um dos pontos de conflito com seu marido e o povoado.

Independência, adultério, futuro, são algumas das questões confrontadas. Mas cabe ressaltar que a direção nunca põe os hábitos cosmopolitas acima dos primitivos. O registro documental, como na citada parte da pesca, mostra o olhar interessado de Rossellini pelo povo, assim como no final dramático, quando Karin tenta confrontar o vulcão e é engolida pela onda de pó, admitindo que não só o povoado está perdido, mas ela também. O que parece interessar é o confronto desses dois polos, essa situação complexa materializada no filho a vir do casal Antonio e Karin, no futuro da Itália.

Por último não poderia deixar de falar de Ingrid Bergman. Este é o primeiro filme em parceria do casal e também o momento do episódio polêmico em que Rossellini e Bergman começaram o seu caso que chocou a imprensa da época. Contudo, vendo o filme com um suposto olhar de realizador, este olhar que o cinéfilo sempre tenta se aproximar e pegar emprestado, não há de fato, entendendo assim a posição de Rossellini, como resistir a imagem de Ingrid Bergman.

Postado por Lucian Chaussard
le-pickpocket.blogspot.com

 No próximo Dezembro, a segunda edição do POP - Encontro das Artes e dos Ofícios do Espetáculo